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sexta-feira, 5 de maio de 2017

INTERNAUTAS LOUCOS VOL.1 - SR. E SRA. ROBINS - UM CONTO DE DANIEL OLIVER


Mais uma vez, a Sra. Robins entra em seu quarto e encontra seu marido, Sr. Benedito Robins, batendo sua cabeça contra o armário.

Ele não era muito velho, tinha 47 anos de idade.

Mas as últimas semanas o fizeram muito mal, ele parecia bem mais velho. Sua esposa se preocupava com ele cada dia mais: Benedito não tomava banho há muito tempo, fazia suas necessidades nas calças, falava embolado e até babava às vezes.

Ele jogava sua cabeça violentamente contra o armário de madeira, soltando um grito de dor a cada batida. O armário começara a rachar, sua testa estava coberta de farpas e sangue, o mesmo sangue que estava amassado contra o armário.

Sra. Robins, pôs sua mão no ombro do marido, ele olhou bruscamente para ela, como se o dedo dela estivesse em brasa. A mulher, assustada, deu um pulo para trás. Benedito, ao ver sua esposa, deu um sorriso babão, com a língua pra fora. Seus olhos mostravam um interesse doentio, como o de um homem que esconde algum segredo para alguém que tenta adivinhá-lo. “Vai ficar tudo bem, querido”, Sra. Robins chorava com um sorriso de consolo, colocando suas mãos no rosto do marido.

Ele já estava desse jeito há algumas semanas.

Benedito se tornou um garoto velho. “Vams achr mieu tisoru?”, Ele falava alegremente, com a língua solta na boca, como se não pudesse movimentá-la. A expressão de esperança era como a de uma criança que esperava um chocolate do pai. Sra. Robins continuava chorando com um sorriso triste, ainda segurava o rosto do marido. “Querido”, ela fez uma pausa e continuou bem baixo, “não existe tesouro”. Benedito arregalou os olhos, sua boca estava tremendo muito. A expressão de esperança se transformou em fúria.

“Eu quelo mieu tisoru”, ele gritou muito alto e saiu correndo pelo quarto quebrando todos os enfeites da escrivaninha, chutou a televisão que soltou uma grande faísca quando arrebentou o fio da tomada. Ele voltou furioso para frente do armário e batia a cabeça fortemente a cada palavra: “Eu quelo mieu tisoru”, e repetia várias vezes, com muita raiva. Sua esposa chorosa rezava ajoelhada perto da cama.

No dia seguinte, a Sra. Robins fez um curativo na testa do marido. Ele estava desmaiado e foi retomando a consciência aos poucos. “Vams achr mieu tisoru?”, foi a primeira coisa que ele disse ao acordar. “Vamos sim, querido, vamos sim”, ele abriu um grande sorriso de felicidade. Benedito se levantou e começou a bater novamente a cabeça no armário de madeira maciça.


Sra. Robins deixou o marido lá, castigando a própria cabeça, e dirigiu-se para a mesa da copa. Ela se assentou e acendeu um cigarro. Com sua mão tremendo, enxugou as lágrimas com a mesma mão que segurava o rolo cilíndrico de tabaco e, ali, ficou pensativa por alguns momentos. Seu rosto se levantou com um ar revelador, porém triste, Sra, Robins respirava com dificuldade e medo.

 Andou até o armário da cozinha e retirou de lá um rifle Winchester 44 e uma Colt Python de calibre .357 Magnum, ambas as armas o marido comprara para se proteger contra invasões residenciais recorrentes naquela época. No final da tarde daquele mesmo dia, Sra. Robins já tinha preparado tudo. No porta malas de seu carro tinha as duas armas, uma pá, um grande saco de plástico preto, uma cruz de madeira e uma caixa de balas para a Colt.

Ela colocou seu marido no banco da frente do carro e dirigiu com ele em direção à Montanha do Mirante, que era um lugar bem alto fora da cidade onde ninguém ia e, lá de cima, podia-se ver toda a região metropolitana.

Enquanto o marido enfiava o dedo no nariz e comia o próprio ranho, Sra. Robins seguia todo o caminho com uma expressão assustadoramente neutra no rosto, com algumas lágrimas descendo dos olhos. Todos os sinais até lá estavam verdes.

Quando chegaram, o sol já estava se pondo. “Procure seu tesouro ali”, disse Sra. Robins apontando para uma área de terra para o mirante. Ele abriu um largo sorriso, dirigiu-se para o local correndo de um modo desengonçado e começou a cavar com as mãos. Sra. Robins foi até o porta-malas e pegou o rifle Winchester, checou se ela estava carregada e engatilhou. Ela olhou para o marido cavando o buraco distraidamente, respirou fundo e começou a se aproximar dele devagar até encostar o cano da arma em sua nuca.

Quando ele sentiu, olhou para trás devagar, agora a arma estava em cima de seu curativo. Sra. Robins começou a tremer, se olhavam diretamente nos olhos, ela começou a chorar e, em seguida, respirar rápido. Ele abriu um grande sorriso e ela atirou.

Os pássaros voaram com o estrondo da arma.


Pedaços grandes de seu cérebro voaram para terra, podiam-se ver lascas de crânio espalhadas no chão. Da mandíbula para cima não sobrou nada, a língua saia do pescoço e os dentes de baixo estavam trincados, enquanto os de cima devem ter voado alguns metros de distância e se transformado em farinha de osso.

 Foi uma questão de segundos entre o momento em que ela puxou o gatilho e o que a cabeça do marido já estava toda espalhada no chão, mas ela lembrava como se fossem minutos. Tudo foi em câmera lenta. O rifle caiu da mão de Sra. Robins, ela desabou em choro por alguns minutos. Em seguida, pegou o saco preto e a pá no carro, colocou o corpo do marido dentro do saco e começou a cavar um buraco na terra com a pá.

 Enquanto cavava, ela se lembrou de algumas semanas atrás, quando Benedito comprou um computador novo, ele estava realmente empolgado. Ela estava toda suja de terra e sangue. Um amigo do trabalho do Sr. Robins havia indicado um site onde ele poderia ouvir músicas gratuitas.

Seguindo as indicações do amigo, ele abriu o Internet Explorer e digitou o site na barra de endereços. Alguns minutos depois ele corre para a cozinha onde encontra sua esposa fumando e lendo o jornal: “Querida, querida, estamos ricos”. Benedito começou a pular de felicidade. Sra. Robins estranhou muito e perguntou o porquê. “Eu abri o site de música e uma mensagem apareceu dizendo que eu era o milionésimo visitante, então eu ganhei um milhão de dólares”.

Ele estava realmente feliz. “Querido, isso pode ser...”, ela começou, mas foi interrompida por Benedito: “Quando eu cliquei, abriu uma janela pedindo para eu colocar minha conta do banco e minha senha, e o site ia depositar para mim. Nossa, querida, nem acredito”.

Ela terminou de cavar e colocou o corpo do marido dentro do buraco, e, em seguida tampou com a terra. Sra. Robins pegou dois galhos, rasgou a manga de sua blusa e improvisou uma cruz de madeira, que fincou no local onde a terra estava mais alta. Com um ar determinante, ela foi até o carro outra vez e pegou a Colt.


Ela andou até a beira do penhasco, pensando que seu marido nunca recebera o dinheiro e perdera tudo que tinha no banco. Ele nunca achou seu tesouro.

Sra. Robins ficou de costas para o abismo, fechou os olhos e colocou a arma na boca, até encostar-se na úvula.

Ela sentiu o gosto metálico do cano em sua língua.

Sra. Robins não ouviu o som do tiro.